sábado, setembro 17, 2016

oblivion

a música anda apaixonada pelo espaço sideral, não anda? tem explorado sonoridades e combinações delas que proporcionem aos ouvintes uma sensação, palpável, de os soltar, em câmara lenta numa fofa cama de vazio, que à medida que os envolve os arrefece como uma noite de fim de verão. ao mesmo tempo acende no bréu do céu, primeiro uma, depois duas, quatro, dezenas e profusas centenas de estrelas, auras e auroras boreais. quando uma música consegue este efeito, sequencia e prolonga sons vagos na medida certa, prende de gancho e leva-nos azimutes fora. essas viagens valem a pena o bilhete. talvez porque o abismo puxa-nos sempre. tão tentador quanto aterrador. e eu não me recordo de nada mais abismal do que o nada absoluto.

quarta-feira, setembro 07, 2016

o inamovível sono


imagina: o bintoito dorme todo; até há pouco eu dormia também; acordar nesta casa é como nascer num mundo pós-apocalíptico; é domingo e ninguém fica numa residência universitária num domingo; é suposto almoçar, prolongar a minha vida para o futuro, mas a ressaca afunda o meu corpo na cama; o sol brilha pela janela em tom convidativo, sedutor, e só um passo incauto fora de paredes basta para  ele me avassalar com todo o peso da sua luz; é verão; a radiação do calor ferve as nossas inamovíveis células falidas e falecidas; a terra gira devagar; eu não durmo e eu não acordo; eu espero por ti para deitar a minha cabeça no teu colo; fechar os olhos até estas sensações se cristalizarem no real.
no verão, os domingos à tarde no bintoito, costumavam saber assim.

domingo, setembro 04, 2016

a outra balada de leeroy jenkins

ter mão nos acontecimentos é uma tarefa que me ultrapassou. é a descrença que pauta o ritmo de tudo o que faço, sem, no entanto, me fazer render ao cepticismo. a procura de uma alegria de viver serena e total revelou-se infrutífera, mas como parar sempre foi sinónimo de morrer, eis-me a continuar a caminhada. sem corridas, sem passo tranquilo. sem ânsia e sem capitulação. não se trata de antecipar a derrota, mas de viver o melhor possível com a derrota sobre a minha cabeça.
o que me traz ao título desta publicação: cada rasgo, cada alegria, cada ataque à monotonia da existência não é um acto heróico, mas somente uma tentativa inglória de fazer o que parece ser certo, sem grande convicção no resultado final, mas com todo o coração que é possível colocar em semelhante empreitada. e no fim ganhar uma história parva para contar da estupidez latente daquela decisão impetuosa que se impôs aos acontecimentos. "at least i have chicken".
dou por mim a gritar, interiormente, "leeroy jenkins!" todos os dias, e cada vez mais me convenço que sem esse call to arms as coisas não aparecem feitas. a ironia da escolha deste lema em particular, é que ele não é nada senão o reconhecimento do ataque desgarrado na cara derrota completa.