quinta-feira, dezembro 06, 2007

De A a Zé

Zé era um puto. 13 pr'aí, dizia-se.Um sacana dum fedelho safado. Mal-educado e respondão: constava-se, talvez uma má educação em casa. Ou apenas palavras amargas ditas no carinho de uma mão pesada. Ou então mimo a mais, mesmo. O Zé gostava de rock n roll. O Zé não devia gostar de rock n roll porque quem gostava de rock n roll tinha dinheiro para gostar de rock n roll. Logo, depreende-se, que ouvia orelhudos mais orelhudos que outros, e que as guitarras não eram para todos, mas para alguns e isso deixava o Zé de orelhas a arder. Foda-se! Foda-se, foda-se, foda-se... O Zé não era propriamente pacato. Nem no vocabulário, nem a agir. Nem a pedir a autorização (porque não a pedia), nem a bater à porta (porque era o único sítio do mundo aonde ele não batia). Depois havia quem se queixasse disto e do Zé e daquilo e do Zé: a verdade é que ele conseguia ser um verdadeiro popular lá na escola dele, o que era para todos os efeitos notável dado o seu historial, problemático, vá lá!, nem tanto, mas bizarro. Cuspia muitas vezes, o Zé. Em especial quando via os freaks a passar com ar de intelectualóides sofredores. E por aquelas bandas o que mais havia era freaks. Que ainda no dia anterior iam c'os paizinhos tomar um pingo ao salão de chá onde o café é a 80 cents. Aquilo não lhe entrava na puta da cabeça. Por isso ia entrar pela cabeça dalguns putos adentro no campo de futebol. Vá lá, às vezes só nas pernas, porque a bola tinha cara de fenómeno, pois afinal era quadrada e isso não era coisa que se visse todos os dias. Quem dera aos professores poder dizer o mesmo dele. Sim! Porque o José não faltava a aulas. O Zé envenenava-as com a sua presença e imposição da sua pessoa e da sua prosa refinada: ligeiramente a mesma postura com que ouvia o seu rockzinho. O resultado tinha tanto que se lhe dissesse que volta e meia o Zé juntava as duas coisas e os professores adoravam.
Mas havia um pormenor que deixava o Zé particularmente deleitado. Era saber que ele era o futuro, e que seria a selecção do resto do mundo a ficar com ele.

Um comentário:

Maudlin disse...

E quantos de nós não têm um 'Zé' encarcerado cá dentro! Alguns hão que o mantêm amordaçado enquanto outros, outros há julgando-se Josés sobre os Zés. Verdadeiro requinte :D É fabuloso o quão refinados conseguimos ser! Acho que não lhe vou chamar precariedade...Por hoje, talvez só idiotice.


E sai um "Foda-se! Foda-se, foda-se" q.b.




Belíssimo texto para variar, senhor Pedro ;)

Bom Natal*