terça-feira, dezembro 01, 2009

Contra-Informação

O Governo Português não dá descanso à sua fome de empreendimento. Aliado às mais altas instâncias financeiras lançou mãos á obra de um projecto que fará o TGV corar de vergonha: o Vinho de Lisboa.
É por demais reconhecida a fama da cultura vinícola nacional, mas falta-lhe a união e a dimensão devida no mercado internacional. O Governo visa assim, não só, colmatar uma falha da oferta no mercado do vinho de qualidade, como criar um produto unânime em torno do qual se possam agregar pequenos e grandes produtores, uma imagem de marca, omnipresente no mais pequeno tasco familiar, como em qualquer restaurante agraciado com 3 estrelas Michelin.
Porém, um 'ícone' não nasce da noite para o dia. Daí o Governo estar a recorrer a todos os meios ao seu dispôr para o conseguir. A primeira medida, porventura a mais dispendiosa e a que mais polémica poderá fazer surgir junto ao bolso dos contribuintes, é a criação da Zona Demarcada do Tejo. "Este Executivo não esperava facilidades quando aprovou este projecto. Como também não as esperava quando avançou com o Simplex, ou o Choque Tecnológico, mas agora atentem nos resultados: Portugal não está na cauda da Europa, mas na sua cabeça, como preconizava Fernando Pessoa.", declarou na conferência de apresentação á Comunicação Social, o Ministro da Agricultura, a quem foi atribuída, para este efeito, a pasta das Obras Públicas. Os primeiros estudos apontam para que a Zona Demarcada do Tejo se estenda desde Salvaterra de Magos até Vila Velha de Ródão, ao longo do Tejo, cujas margens e vales serão socalcados, adubados, e tratados pelas empresas mais especializadas da área e com obra feita em vários pontos do Centro e Sul do País, para que o terreno se torne tão perfeito à produção do novo vinho quanto seja possível humanamente conceber.
Mas o projecto não se fica por aqui. Está já em marcha a construção de inúmeras caves em Almada, para que também esta cidade-irmã da capital possa beneficiar desta iniciativa ab initio. "Foi necessária alguma diplomacia" declarou o Presidente da Câmara de Almada, "mas o Governo sempre se mostrou sensível á necessidade de enquadrar este projecto nas necessidades da Área Metropolitana. Como tal, este desenlance não é outro que não o esperado, sendo de louvar a rapidez das decisões e a união de esforços entre o sector público e o privado, que tanto às turras andam neste país." Associada à criação das Caves de Almada, na zona ribeirinha, está também a compra de uma frota de ferry-boats próprios para o transporte dos barris de vinho desde o início da Zona Demarcada, junto à fronteira, até às caves em Almada. Carinhosamente, já há quem lhes chame de barcos-restelo, em alusão ao Velho dos Lusíadas, céptico crónico do poder das embarcãções em ligar territórios irmãos. Os barcos-restelo, mais do que uma medida funcional, são vistos como uma cartada cheia de potencial turístico, estando planeada igualmente a construção de diversos cais nas maiores cidades ribeirinhas do Tejo, para que os turistas-do-vinho, possam subir ou descer o rio, desfrutando da sua paisagem inigualável e promovendo o desnvolvimento dos serviços de hotelaria e restauração um pouco por todo o interior centro. Aliás, se tudo correr conforme planeado, a Zona Demarcada do Tejo estará pronta em tempo recorde de ser considerada a mais nova Zona Demarcada do Mundo, e quem sabe candidatar-se nessa categoria a Património Mundial da UNESCO. Isto é, pelo menos, o que os entusiastas financiadores deste projecto almejam, sem o negar.
Óbvio, que tudo isto seria defraudado sem o marketing necessário, que aliás o própio nome do vinho quer assegurar. A marca 'Vinho de Lisboa' tem inclusive já uma designação em inglês, sonante como convém, para captar as atenções do tão apetecido mercado britâncio e anglo-saxónico: Olisbon Wine. "Orgulho-me de ter sido uma escolha minha. Têm de admitir que é orelhudo." declarou o Ministro da Economia, sacando com mestria umas gargalhadas à assistência e aos seus colegas de Governo.
A capital do país será, de resto, a capital do vinho homónimo. A abertura de diversas casas especializadas, a criação de um posto permanente de turismo sobre a 'Rota dos Restelos' (assim se chamará o percurso turístico da Zona Demarcada do Tejo, até às Caves de Almada), a divulgação em colóquios e concursos de vinhos na capital, concursos de design e cultura urbana sobre o Olisbon: tudo está já a ser planeado ao milímetro pelo executivo camarário de Lisboa.
A expectativa é alta, e ao que tudo parece os meios ao dispor também o são para não a defraudar. O país anseia saber o poder deste vinho nas suas mesas e nas suas vidas. Mas o sentimento reinante é de confiança. A apoio da indústria vinhateira, só não é unânime devido a alguns protestos de produtores de vinho duriense, que contudo não chocam com a posição oficial: venha a nós o Vinho de Lisboa!
E se até na esfera virtual já circula o lema "Sexo, Drogas & Rock n roll, Não! Fado, Futebol & Olisbon, Sim!", mais palavras para quê?
p.s.: e agora eu pergunto: seria isto assim tão inacreditável?

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