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segunda-feira, janeiro 09, 2023

é preciso

Determinados sons
só os entendem, nesta terra,
a noite:
o do silêncio, para começar,
a seguir, o do ar pulsando nos ouvidos

Só depois chegam os mais conhecidos:
carro a passar, um sino em agonia,
folha ao longe

Mas esses: marginais,
bastardos de uma noite
que outros filhos tem

Na zona quase escura do pensar,
o tom que se perfila
permite o que de verso
e a noite entende

A terra não soçobrou, antes segura
o que de mais humano
nos abriga:
universo implodindo
nestas sombras
pulsando, independente

A frente de silêncio,
lento tornado lento,
desloca os movimentos conhecidos
dispersando-os nos sons 
e na memória

Porque a terra não cai,
e por isso sustenta o que é mais frágil
o que de mais humano
nos sustém:

disse-me alguém, numa tarde
com sol, estrada redonda

enquanto as oliveiras
menos densas que a rocha,
se seguravam, belas,
na paisagem.

Ana Luísa Amaral,  "Da Terra Sobre os sons: Fulgurações", em "E Todavia"







P.S.
(é só preciso chegar-se um pouco tarde
demais
é preciso ser-se só um pouco triste
demais
é preciso ser-se um pouco mais só
nada mais)

quarta-feira, novembro 16, 2022

a gibson do náufrago




O céu azul - o meu
olhar - e sem imagens.
Onde te precipitas tu
nesta equação?

Que fenómeno químico e real
te faz descer em verso,
entre os meus dedos?

Ana Luísa Amaral, excerto "Equações", "E Todavia"

terça-feira, setembro 27, 2022

"Just know it won't hurt so / Won't hurt so much forever"

Nunca viveu a sintaxe
de coisa outra
que não fosse um caos 
ameaçado

E a ordem
esteve sempre em recessão
desde o primeiro
acaso

Nunca as coisas
de dentro
entraram dentro
em tom propositado

E o sentido
foi sentimento
mesmo quando
ensaiado

Nunca em suma
se obteve
a soma
concluída

Porque a soma
imperfeita
foi o metro
de que se fez a vida


Ana Luísa Amal, "Sons, e alguma vida", em "E Todavia"