segunda-feira, setembro 05, 2011

naqueles dias, os dias começavam quando começavam mesmo e não por se ter estipulado numa convenção qualquer. e acabavam quando estavam todos sentados à mesa, a beber, a falar alto, a gozar uns com os outros, os miúdos ansiosos por se porem a correr á volta das mesas e das cadeiras ou por se encafuarem nos quartos e tirar as teimas dos vencedores dos jogos da tarde. à semana era o verão. o verão mesmo. o verão em que se acorda cedo por ser a hora em que o sol acorda também. um verão mais fresco do que o dos dias de hoje, forrado a cal, alimentado a pão com manteiga, recortado pelo horizonte do monte e das suas três árvores ciclópicas que não existem mais. naqueles dias, três de nós iam para cima da velha corte de coelhos ver o pôr-do-sol contar anedotas e sonhar com o dia em que teríamos uma mega drive. e setembro ainda era o mês mais triste do ano, porque o verão acabava. e com ele as escondidas nos socalcos, àrvores e tanques, as emboscadas aos gatos, as corridas de bicicleta. chegava setembro e passava a estar frio para se jantar tarde, tarde para preparar o regresso á escola e tarde para continuar a manter junta uma família feliz que crescera para além dos limites. fazia-se tarde: cada um teria de voltar para casa. voltamos todos, menos os dois velhinhos que esperam pacientes o nosso regresso. e no entanto, quase vinte anos depois daqueles dias, todos voltamos, multiplicados em número e em tamanho, dobrados, amassados, atrasados pelas convenções que estipularam o que os dias de hoje seriam. são outros os miúdos que correm à volta da mesa, a própria mesa é diferente e setembro já não é o mês mais triste de todos, mas os domingos de verão continuam a pôr-se com a mesma benevolência. quanto aos velhinhos que esperam pacientes, esperam com mais entusiasmo do que nunca. são felizes e olham para os seus dezassete com sentimento de missão cumprida.

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