sexta-feira, abril 05, 2019

B.O.G.

A minha insuspeita paixão pela saga Dragon Ball, não me ilude quanto à geral pouca complexidade das narrativas e moral das suas histórias (apesar da sua iconografia, do suspense, da fantasia, das lutas, etc). De resto, e apesar do amor dos fãs, a "franquia" emudeceu durante uns bons anos.
O filme "Battle of Gods" mudou este estado de coisas, à custa de uma cena em particular. Com a elegância e pujança de um clássico.

Algum contexto: Beerus, o Deus da Destruição, acorda após um longo sono, e é avisado de uma profecia na qual um ser, denominado "Super Guerreiro Deus", seria capaz de o desafiar em batalha; confrontando Son Goku, um dos poucos Super Guerreiros conhecidos, Beerus constata que o mortal, apesar de poderoso, nem sequer serve para aquecimento; Son Goku, que no final da série Dragon Ball Z ascendera acima de todos os deuses então conhecidos, e a um poder capaz de destruir um universo inteiro, resume-se à insignificância; após uma parafernália de lutas com Beerus, os personagens descobrem, através das bolas de cristal, que um Guerreiro do Espaço apenas poderia ascender ao estado de "Super Guerreiro Deus", através de um ritual no qual 5 Guerreiros do Espaço, de coração puro, transmitiam a sua energia a um 6º, o qual ascenderia a esse nível, capaz de desafiar o impiedoso e diletante Deus da Destruição.
Son Goku (obviamente) é o escolhido para ascender ao nível profetizado, e pela primeira vez Beerus encontra um adversário digno desse nome. Son Goku, porém não está satisfeito, ou entusiasmado: os insofismáveis poderes foram-lhe dados e não adquiridos à custa do seu esforço. O que diverte e intriga Beerus. À medida que o combate se desenrola, Beerus prolonga a luta o quanto pode, saboreando o desafio, mas a diferença entre ambos é notória. Incapaz de manter o estado Son Goku retorna ao seu nível básico. Beerus desinteressa-se. Cumprida a profecia, restava-lhe destruir o planeta - o seu trabalho e especialidade.

Aí entra a cena em questão: Son Goku não desiste e continua a comprar uma luta que não pode ganhar. De algum modo, através da luta, que mais não foi que um treino com Beerus, o Guerreiro do Espaço aprendeu e apreendeu a força do Super Guerreiro Deus. 
Beerus constata-lhe o óbvio: ele superou todas as expectativas, mas já não é um deus. A luta não faz sentido.
Son Goku, o mortal mais forte que os deuses, que vence por lutar para não perder, pergunta-lhe que diferença faz ser ou não ser um deus. Quando ele está ali, perante o desafio, com vontade de lutar, com capacidade para o fazer, e sem recuar.

Esta cena, para mim, é uma analogia a toda a história do desenho animado. Que ascendeu a níveis estratosféricos de popularidade e relevância, e se quis reinventar, com o que aprendeu, para ser melhor, para não parar de lutar. Porque o status quo, mesmo para um "deus" nada significa, quando não se está disposto a lutar por mais, e a aprender com quem é melhor.

Dificilmente um desenho animado ensinaria a adultos e graúdos uma lição de motivação tão valiosa. Sobretudo uma que já tanto nos deu.


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