sexta-feira, abril 24, 2009

o assobio

O céu acinzentava de forma crescente enquanto eu lutava para que o lume do isqueiro fosse o lume do cigarro com a palma da minha própria mão. E o céu, indiferente, esboçava-se, nubloso em várias camadas de tons opressivos e escuros, numa inevitabilidade de claustrofobia em altas altitudes. O lume bruxuleava e fugia, em passes de magia desgastados de tão repetidos, como os que os adultos fazem com as palmas das mãos aos bebés pequeninos. Ainda tentava abanar o isqueiro, desencantar uma forma de ele não me deixar na mão, com o monstro que tinha a crescer dentro de mim e que só sucumbiria às mãos daquele cigarro piedoso, quando todo o resto do céu e da terra eram uma ditadura de fins monótonos e maquiavélicos. Aquele cigarro era a minha única esperança, e o lume a minha arma, fugia-me. Eu desesperava.
Até que consegui. E o alívio correu-me boca laringe pulmões poros ar e nariz e boca novamente. E ao cinzento da minha vitória apenas temi que se perdesse nas nuvens da minha desgraça.


"If only I could be as cool as you
As cool as you

Body and soul Im a freak Im a freak
Body and soul Im a freak"

- Silverchair

2 comentários:

Joana Banana disse...

curioso haver uma arma para a esperança. ou que arma e a esperança se juntem.

a vitória não costuma ser graciosa, nem por graça. desgraçada inrínseca.

o vento ser-te indiferente e mesmo assim frustrar, é também curioso.

a luta consumiu-te sem te fazer desaparecer , ou suprir uma qualquer necessidade dela, incorporando o seu organismo.

Francisco disse...

Já não vinha cá há algum tempo... comi tudo de uma só vez.