Divagando sobre a minha própria dependência, porque não sou outra coisa senão um dependente, acendo o rastilho da ansiedade. Um carro é urgente. Uma casa é urgente. Um sítio longe é muito urgente. E nesse sítio, nessa casa, levado pelo meu carro, chamar-lhe lar. E sem justificação, acumular garrafas de whisky, porto ou aguardente, a ser bebidos em copos baços. Fumar, cigarro após cigarro, dias a fundo e noites adentro, de uma varanda de chão empoeirado, que certamente lá estaria, a debruçar-me sobre esse sítio que me daria saudades do Porto. Do meu Porto. Um sítio onde eu pudesse, livre de paternalismos, deixar as janelas fechadas e as persianas corridas. E nos recantos onde a luz não chegasse proliferariam teias de aranha, de que eu nunca iria dar conta. No chão, manchas de óleo, comida e álcool; as cómodas e as mesas enterradas em pó; no quarto, uma única cama e meia dúzia de cobertas. O frigorífico e a despensa estariam vazios, limitando-se a meia dúzia de itens estragados. Uma televisão com 4 canais, sempre ligada, a meia voz, para fazer ruído, um rádio que não funcionava e um computador só com o word instalado. Em todo o sítio ouvir-se-ia o lacónico barulho da água a correr. Outras vezes o lacónico barulho de grilos, no exterior. E ainda o lacónico barulho de portas a bater dentro de casa, e portas a abrir fora dela, gente a sair, gente a entrar, gente. Em suma, um sítio sem vestígios da minha chegada ou saída, da minha presença ou ausência, um sítio cheio de mim, cheio de tristeza até às marcas de humidade no tecto, isolado porque habitado por isolados e não porque matematicamente concebido para não ser conhecido de mais ninguém. Digamos, uma emancipação.
Um comentário:
tha good life nigga, tha good life
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