há cigarros que gostávamos que nunca terminassem. como se aquele vício fosse uma escapatória, ou até uma cura. julgamos que por aguentar muito tempo sem ele o superamos, e até fazemos orelhas moucas à traça que nos corrói e amolece. mas ele está lá. não importa o quanto nos julguemos melhor do que ele. e quando, por fim, sucumbimos a dar azo ao vício, porque, afinal, até há especialistas que dizem que não são três cigarros por dia que matam uma pessoa, começamos por perceber a inutilidade de lhe dar seguimento: éramos de facto, muito melhores sem esta morte portátil a prestações. só que no fim, com a última passa, chega a verdade. o hálito manhoso. o fumo na traqueia. a dificuldade em respirar. o cancro, por outras palavras. e aí renasce a culpa. e o ódio ao cigarro que não tem culpa nenhuma. e às mãos dilaceradas que o levaram à boca. gostávamos tanto que este cigarro nunca terminasse. para poder guardar para sempre aquele limbo que separa a nossa superação orgulhosa, deste estado vegetativo que não é mais que uma derrota com todas as letras.
e será sempre assim. sempre que puxarmos desse cigarro.
2 comentários:
Um bom blogue , discreto e equilibrado.
Agradeço o destaque dado ao Clube dos Pensadores
Obrigado, e continue o bom trabalho desenvolvido no Clube dos Pensadores.
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